quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Dislexia no Cinema Oriental


Em um dos cursos que estou fazendo na área de Educação Física, resolvi apresentar uma espécie de resenha comentada de um filme indiano que assisti sobre crianças com necessidades e talentos especiais. Estou falando do magnífico Taare Zameen Par ou como ficou conhecido no Brasil "Toda criança é especial". O trabalho recebeu pontuação máxima e resolvi postá-lo aqui para insentivar meus alunos, colegas e amigos a assistí-lo também.
Assistam, vale a pena!
Beijo a todos
Andréa 
 
1. ENSINANDO CRIANÇAS COM TALENTOS E NECESSIDADES ESPECIAIS


1.1             INTRODUÇÃO

“Taare Zameen Par”, ou como ficou conhecido no Brasil, “Toda criança é especial” é um filme delicado e questionador que fala da relação da escola e do professor com o aluno. Produzido e dirigido pelo indiano Aamir Khan, este longa-metragem aborda a vida de um garoto de 9 anos que apresenta inúmeros problemas de rendimento e adaptação escolar, enfrentando obstáculos muito sérios de relação com os pais, na vizinhança e na escola. Toda a história gira em torno da falta de preparo da sociedade em identificar e auxiliar indivíduos que portam necessidades ou talentos especiais, ou ambos simultaneamente.

1.2 DESENVOLVIMENTO

Ishaan Awasthi, o sonhador garoto, já repetiu uma vez o terceiro ano do sistema educacional indiano e corre o risco de repeti-lo novamente. As letras dançam em sua frente, como ele próprio diz, e não consegue acompanhar as aulas nem focar sua atenção. Na aula de inglês há uma passagem muito bem dramatizada na qual fica claro que o garoto apresenta algum problema cognitivo. A professora está explicando a matéria para a turma que presta atenção, enquanto isso Ishaan se distrai com fatos que ocorrem fora da sala de aula. A professora percebe sua distração e pede que ele leia o trecho que os alunos estão estudando. Ele nem consegue encontrar a página correta e um colega de turma o ajuda a faze-lo. Após tentar ler o trecho inúmeras vezes sem sucesso e sendo pressionado de forma cada vez mais intensa pela professora, ele reclama que as letras estão dançando. Toda a turma ri com a sua colocação e a professora se altera. Por fim, incapaz de ler o trecho, ele começa a gritar e a cena termina com a professora colocando-o para fora da sala de castigo. Ele passa toda a aula de inglês em pé, do lado de fora da classe. Neste momento, outros alunos mais velhos, passam e chacoteiam dele, com frases do tipo: “hei garoto, de novo ?”, “e aí, o que aprontou dessa vez?”, com isso entendemos que esse tipo de acontecimento é bem corriqueiro na vida do garoto. Durante todo o filme, é mostrado que ele tem claros talentos artísticos que não são explorados, mas sim fracamente ignorados. Ele desenha historinhas, faz um uso muito especial das tintas e lápis, mas recebe pouco estimula para se dedicar a essas tarefas.

Quando ele retorna do castigo para a próxima aula, seus colegas de classe o lembram, em tom jocoso, que ele deveria ter trazido as últimas provas de matemática assinadas. Nesse momento, percebemos todo o risco que corre a criança com deficit de atenção, pois ele resolve matar a aula de matemática e ficar andando a esmo pelas ruas da cidade, já que havia dado suas provas para os cachorros rasgarem. À noite ele implora ao irmão que o encubra, falsificando a assinatura da mãe em uma carta que justifica sua falta na aula devido a uma febre repentina. O irmão, à contra gosto, faz o que ele pede.
 Há também uma outra passagem marcante, na qual Ishaan está sentado desenhando enquanto os garotos da vizinhança jogam bola. A bola escapa e se aproxima dele, os garotos pedem para que ele arremesse a bola de volta, mas em um total gesto de descoordenação motora, ele lança a bola além dos muros. O garoto líder fica muito bravo e os dois brigam. A mãe do garoto vem queixar-se aos pais dele.
Em casa, todos os problemas do garoto de ritmo e foco se repetem em contraste com a organização do pai, mãe e irmão que seguem a agenda de uma vida produtiva. O valor está nessa pressa, na produtividade, como se isso fosse sinônimo de determinação, empenho e eficácia. Como bem colocou Rosely Sayão, “A pressa tomou conta de nossas vidas. Corremos desde que acordamos... Incentivamos a corrida sem fim dos mais novos: queremos que aprendam tudo rapidamente e cedo...”. Vivemos o ritmo desenfreado do capitalismo, tão marcado pela frase “tempo é dinheiro”. [1]
Seu pai acredita apenas na hipótese de falta de disciplina e trata Ishaan com muita rudeza e falta de sensibilidade, visto que quase todos, de vizinhos aos professores, tratam-no como se ele fosse realmente uma “criança problema”: distraído, irrequieto e briguento.  Após serem chamados na escola para falar com a diretora, o pai do garoto decide levá-lo a um internato, e devido à postura submissa da mulher indiana, a mãe não concorda, mas se cala e acata a decisão do marido. No internato, Ishaan Awasthi se depara com uma realidade ainda mais dura do  ponto de vista pedagógico, pois é um local onde realmente prevalece a ordem e a disciplina, e os professores se põem a despejar matérias e conteúdos sem se preocuparem com a forma como os alunos assimilam tais ensinamentos, afinal todos são submetidos a inúmeros testes. Neste colégio, as aulas são mais intensas e exigentes, de modo que  seus problemas de aprendizado e adaptação tornam-se ainda mais evidentes. O filme revela a percepção que ele tem das lições e conteúdos pedagógicos e podemos compreender a vida, sob a perspectiva de uma criança com dislexia. A lousa, por exemplo, se torna apenas um bloco branco repleto de rabiscos e símbolos ininteligíveis, e por isso ele busca descansar seus olhos na imagem de um pequeno lago, ou qualquer coisa que ocorra fora da aula.

Nesse ponto sentimos toda a dor e desolação de ser deixado em um colégio interno, longe dos pais e do irmão, dos quais tanto gosta. As aulas de Educação Artística são uma verdadeira decepção para Ishaan, visto que ele se depara com um professor cruel e mal humorado. O professor observa impaciente a distração dele, e faz um ponto na lousa e em seguida pede que Ishaan o localize, e quando este não consegue o professor o castiga severamente com a palmatória, visto que a filosofia do internato é a de “domar cavalos selvagens”.
No colégio interno, ele conhece Rajan Damodaram e o professor de literatura os coloca para sentarem-se juntos, visto que este é o melhor aluno da turma. Surge uma amizade verdadeira entre os dois garotos, e Rajan passa a se preocupar com a felicidade de Ishaan. Há um momento crucial em Rajan o surpreende em pé sobre o cercado de um precipício, em uma atitude visivelmente depressiva. Neste momento a vida de Ishaan começara a mudar, pois o amigo insiste que ele vá à aula com o professor substituto de Educação Artística. Há muito tempo que o garoto já não desenha mais.

 Nessa aula substitutiva ele encontra um professor atento e dedicado que acaba por trazê-lo de volta à vida, com seu jeito diferente de educar. O professor de artes logo percebe que o garoto está profundamente deprimido, pois não responde a sua forma espontânea e divertida de ministrar aulas, visto que ele se apresenta aos alunos fantasiado, tocando uma flauta e convidando-os a dançar, cantar e, depois, desenhar livremente, deixando a imaginação correr solta no papel, livre de julgamentos: “Divirtam-se, estão livres para desenhar o que quiserem!”. Ou seja, tudo que Ishaan fazia antes de começar a sofrer opressão e violência no ambiente escolar e familiar.

Nesse momento, a decisão do professor substituto de interferir de forma positiva e consciente no destino do garoto torna-se fundamental, do contrário não haveria um fim construtivo para tamanho sofrimento. O professor ensina também em uma escola para crianças com necessidades especiais, além disso, quando criança ele também sofrera muito com a dislexia, e por isso pode identificar rapidamente essa síndrome em Ishaan. O professor toma o caso para si, assumindo inúmeras responsabilidades, indo à casa dos pais do garoto explicar-lhes sobre a dislexia, e chega a entrar em embate com o pai dele. No colégio, ele também o defende, provando para o diretor que o menino tem um talento especial em artes visuais, embora apresente inúmeras dificuldades em outras disciplinas. Por fim, o professor organiza um concurso de arte que envolve todo o colégio e no qual fica claro que cada pessoa possui pontos fracos e fortes, e enquanto alguns possuem muitas dificuldades em artes, outros se sobressaem. O filme termina com Ishaan vencendo o concurso, e finalmente sendo compreendido por todos que o cercam.


1.3 CONCLUSÃO
                 O filme nos faz pensar sobre a dura realidade de crianças portadoras de talentos e necessidades especiais, pois frequentemente não são compreendidas em nenhum desses dois aspectos, visto que principalmente no sistema educacional brasileiro há inúmeras deficiências para identificar e amparar esses sujeitos.
                 Podemos pensar no quanto, na qualidade de educadores, estaremos preparados para lidar com problemas como a dislexia, visto que para termos uma postura acertada, precisamos de conhecimento, de especialização, do apoio de associações e estudiosos, e da participação da família e da sociedade. Sabe-se que para compreender melhor a dislexia devemos nos remeter ao entendimento do ser humano: de quem somos, do que é memória, pensamento, percepção e linguagem.
                 Para se ter uma idéia da importância de discutiremos essa temática, cabe lembrar que os estudos mais abrangentes e sérios sobre o assunto, registram 20% da população americana como dislexa, ou seja, de cada 10 alunos em sala de aula, dois são disléxicos, com algum grau considerável de dificuldade na aprendizagem. Além disso, é relevante citar que estudos de universidades americanas revelam que entre 70% e 80% dos jovens delinqüentes do EUA apresentam alguma dificuldade de aprendizado.
                 No tocante à Educação Física, cabe-nos lembrar que a dislexia, assim como outras síndromes, pode causar ao portador muitas dificuldades de coordenação motora e consciência corporal. Entre os sintomas e sinais da dislexia podemos salientar os seguintes, lembrando que muitos deles afetam diretamente o desenvolvimento do aluno nas aulas de Educação Física e na vida, e podem ser facilmente percebidos por um profissional atento, são eles:

1 - atraso no desenvolvimento motor desde a fase do engatinhar, sentar e andar;
2 - atraso ou deficiência na aquisição da fala, desde o balbucio á pronúncia de palavras;
3 - parece difícil para essa criança entender o que está ouvindo;
4 - distúrbios do sono;
5 - enurese noturna;
6 - suscetibilidade à alergias e à infecções;
7 - tendência à hiper ou a hipo-atividade motora;
8 - chora muito e parece inquieta ou agitada com muita freqüência;
9 - dificuldades para coordenar movimentos;
10 - dificuldades de adaptação nos primeiros anos escolares.
11- dificuldade com lateralidade, entre muitos outros sintomas e sinais.[2]
Assim, munidos de mais informações podermos ajudar de forma mais acertada e duradoura essas crianças que cruzarem nossos caminhos, para tanto disseminando a idéia do filme, de que toda criança é realmente especial e deve ser tratada com respeito, profissionalismo e humanidade.

1.4 REFERÊNCIAS
Ciasca, S. M. (Org). Distúrbios de aprendizagem: proposta de avaliação interdisciplinar. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.


Ultimo acesso em 07/08/2011

[2] Os sintomas e sinais da dislexia estão acessíveis nos site: http://www.dislexia.com.br/sintomas.htm
Ultimo acesso em 07/08/2011

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